Ugo Cerletti nasceu em Conegliano, na região do Veneto, Itália, em 26 de setembro de 1877. Ele estudou medicina em Roma e Turim, posteriormente especializando-se em neurologia e neuropsiquiatria. Depois de formado, estudou nos serviços dos mais proeminentes neurologias de sua época, primeiro em Paris, França, com Pierre Marie e Dupré, depois em Munique, Alemanha, com Emil Kraepelin (o "pai" da moderna psiquiatria científica) e Alois Alzheimer (o descobridor da demência senil, que hoje leva o seu nome); e ainda em Heidelberg, com Franz Nissl (um neuropatologista)
Após seus estudos, ele foi indicado para ser diretor do Instituto Neurobiológico, no Instituto de Doenças Mentais de Milão. Em 1924 ele aceitou um cargo de docente em neuropsiquiatria, em Bari, e em 1928 sucedeu o Prof. Enrico Morselli, na Universidade de Gênova. Finalmente, em 1935 ele se tornou catedrático do Departamento de Doenças Mentais e Neurológicas da Universidade de Roma, onde ele desenvolveu o método de choque eletroconvulsivo para o tratamento de diversos tipos de doenças mentais, uma descoberta que o fez mundialmente famoso. f.
Cerletti chegou ao eletrochoque para fins terapêuticos em seres humanos através de seus experimentos com animais sobre as conseqüências neuropatológicas de ataques repetidos de epilepsia. Em Gênova, e posteriormente em Roma, ele usou um aparelho de eletrochoque para provocar de forma confiável ataques epilépticos repetidos em cães e outros animais. A idéia de usar o eletrochoque para acalmar pacientes mentais ocorreu a Cerletti enquanto observava porcos serem anestesiados com choques elétricos antes de serem sacrificados no matadouro de Roma. Além disso, em 1935, uma droga epileptogência chamada cardiazol, e a insulina, um hormônio estavam começando a serem utilizados em vários paises para tratar esquizofrênicos, com grande sucesso. Esta abordagem se baseava no trabalho do NobelistaJulius Wagner von Jauregg's, que tinha utilizado febre induzida por malária para tratar a demência paralítica, assim como na teoria de Ladislaus von Meduna de que a esquizofrenia e a epilepsia eram mutuamente antagonísticas. Essas pesquisas levaram, no mesmo período, à descoberta da terapia por coma insulínico por Manfred Sakel, em 1933.
Cerletti utilizou o eletrochoque pela primeira vez em um paciente diagnosticado como esquizofrênico, com alucinações e confusão mental, em abril de 1938, em colaboração com Lucio Bini. Uma série de eletrochoques foi capaz de devolver o paciente a um estado mental aparentemente normal. Consequentemente, nos anos seguintes, Cerletti e seus colaboradores fizeram experimentos com milhares de eletrochoques em centenas de animais e paciente, e conseguiram determinar sua utilidade e segurança na prática clínica, para diversas indicações, como em esquizofrenia aguda, psicose maníaco-depressiva, depressão maior, etc. Seu trabalho foi muito influente, e o eletrochoque rapidamente se disseminou como um procedimento terapêutico por todo o mundo.
Em sua longa atividade como neuropsiquiatra, Cerletti publicou 113 papers originais sobre diversos temas, inclusive sobre a patologia das placas senís observadas na doença de Alzheimer, sobre a estrutura da neuróglia, barreira hematoencefálica, neurosífilis, e outras. Em 1950 ele recebeu um doutorado honorário na Sorbonne (Universidade de Paris), em adição a uma longa lista de prêmios e honrarias.
Cerletti morreu em Roma, em 25 de julho de 1963.
Em: A História da Terapia por Choque em Psiquatria
Por: Renato M.E. Sabbatini, PhD
Em: Revista Cérebro & Mente, Dezembro 1997/Fevereiro 1998