De: Airton Wilges [airtonwilges@olimpo.com.br]
Enviado em: quarta-feira, 10 de maio de 2000 19:39
Para: Uol
Assunto: Re: catapulta do emocional
Prezado Dr. Fragomeni
Acuso e agradeço o recebimento do artigo intitulado "A catapulta do emocional". Conforme sua solicitação, apresento-lhe, a seguir, minhas considerações sobre o mesmo.
A teoria de que o neocortex não passa de um órgão criado pela experiência de vida é defendida por diversos estudiosos. Segundo eles, ao longo do processo evolutivo, mutações diversas foram selecionando caracteres capazes de conferir a diferentes espécies, vantagens capazes de garantir-lhes a sobrevivência, na intensa luta contra tudo e todos, que caracteriza a vida. Estas vantagens podem ser, por exemplo, a capacidade de mimetizar seu ambiente passando despercebido; membros fortes que permitem alcançar grandes velocidades e, desta forma, mais facilmente fugir de predadores e/ou alcançar suas presas preferidas; desenvolvimento de sentidos (visão, olfato, etc..) altemente especializados, acurados e discriminativos, etc.. Com certeza o desenvolvimento de um sistema capaz de armazenar milhares/milhões de informações sobre sinais referentes a perigos, possibilidades de alimentação e acasalamento, além de integrar e coordenar as diferentes funções fisiológicas do organismo, é altamente positivo, equipando os seres para melhor preservar suas vidas individuais e garantir a sobrevivência das espécies. A sobrevivência dos mais aptos foi permitindo a transmissão de suas mutações favoráveis e o aperfeiçoamento de suas expressões.
Com certeza, muito ainda permanece por esclarecer neste campo. É plausível, porém, admitir a evolução de seres hominídios, com sistemas nervosos cada vez mais apurados, a partir do exito, em termos de sobrevivência, de descendentes de proto-homens cujos sitemas nervosos, por razões desconhecidas, sofrerem mutações favoráveis.
É interessante assinalar que alguns estudiosos do campo das neurociências, consideram ser o homem uma espécie inviável, fadada ao fracasso, em decorrência da incapacidade de harmonizar seu cérebro novo (neopalio), com os seus cérebros mais antigos.
Para outros autores, no entanto, as emoções representam um aspecto dinamogênico, indispensável à preservação da vida.
Abre-se pois um campo de opiniões divergentes cujas origens já podem ser reconhecidas em antigos debates filosóficos sobre a pugna entre as paixões e a razão, inclinando-se alguns pensadores por esta e outros por aquelas.
Referindo-nos ao terreno filosófico, sua descrição da pulsão de vida fez-nos imediatamente pensar na vontade, tal como a descreve Shopenhauer, em seu livro "O mundo como vontade e representação". Comentando a filosofia schopenhauriana resume Sprigge que "o universo é uma única, vasta, Vontade Cósmica de Existir que se auto-vivencia através de uma aparente diversidade de seres conscientes em um mundo espaço-temporal e determinístico". As implicações metafísicas são evidentes, mormente sabendo-se que Schopenhauer admirava os Upanishad, que pregam ser o mundo a corporificação de Brahman. A vontade seria pois uma enteléquia a governar as diferentes manifestações do mundo. E pareceu-nos captar em seu artigo uma admissão desta enteléquia uma vez que em duas ocasiões o senhor menciona o surgimento de mutações de virus, consequentes a uma "intenção" da pulsão de vida em destruir a espécie humana. É uma hipótese filosófico/religiosa, defensável dentro desta área, porém não é cientificamente verificável.
Também não cientificamente verificáveis são suas afirmações que "o homem perfeito, simbolizado em Jesus Cristo, seria um ser com a potencialidade do neocortex totalmente "ativada" "  e, mais adiante, "a intermediação para que houvesse uma plenitude da manifestação deste conhecimento dar-se-ia através da atuação de um fator intermediário, o emocional, o que assemelha-se àquele que está simbolizado no Espirito Santo". Estamos aqui no campo religioso, não comprovável, baseado na autoridade dogmática de textos religiosos, ditaddos em épocas e lugares diferentes, por Deus ou seus mensageiros a homens/mulheres escolhidos, textos estes que se contradizem frontalmente, albergando proposições radicalmente antagônicas.
Concordo que a vivência religiosa seja extremamente importante para muitos seres humanos, mas isto não garante a sua realidade transcendental. Compartilho, neste assunto, da opinião de Carl Gustav Jung que, em seu livro "Psicologia e Religião", menciona que "o termo religião expressa a atitude particular de uma consciência transformada pela experiência do numinoso", advertindo, porém, que 'o psicologo orientado cientificamente deve desatender a pretensão de todo credo a se proclamar verdade única e eterna. Dado que se ocupa da vivência religiosa primordial, deve centrar sua atenção no apecto humano do problema religioso, fazendo caso omisso do que com ela fizeram as denominações".
Tendo em vista estas considerações, minha opinião é que seu trabalho deve ser encaminhaddo para uma publicação dedicada a temas filosóficos e religiosos e não para Cérebro e Mente, que é uma revista especializada em neurociências. De qualquer forma estarei submetendo seu artigo, juntamente com estas minhas observações, à apreciação dos demais membros do Conselho Editorial da revista Cérebro e Mente.
Atenciosamente,
Julio Rocha do Amaral
-----Mensagem original-----
De: Uol <jcfragomeni@uol.com.br>
Para: julioamaral@pobox.com <julioamaral@pobox.com>
Data: Quarta-feira, 3 de Maio de 2000 11:00
Assunto: catapulta do emocional

Prezado Sr. Dr.Júlio Rocha Amaral
 
Apesar de ser urologista, e  ter sido professor de urologia, me dedico ao estudo do cérebro como um hobby.
Por ter uma formação diferente tenho idéias diferentes a respeito do assunto.
Solicito sua avaliação do trabalho anexo , tendo em vistas a publicação na revista cérebro e mente.
Atenciosamente
Aguardo sua manifestação
                                                        José Carlos Fragomeni