Desenvolvimento do Cérebro e Aprendizado
Paul J. Eslinger
Há um refinado sincronismo entre como o cérebro se desenvolve e o que modela seu crescimento e maturação. É evidente desde a primeira infância que a estrutura e as conexões do cérebro são realmente esculpidas por numerosas influências ambientais e biológicas. Como o centro do pensamento, emoção, planos de ação e auto-regulação da mente e do corpo, o cérebro passa por um longo processo de crescimento, que de fato dura a vida inteira. Este desenvolvimento é mais intenso nos primeiros anos de vida, crescendo rapidamente através da infância, até a adolescència e no adulto jovem, e continua com diferentes fases de crescimento e mudança por toda a vida adulta;
O que isto nos diz sobre a influência das experiências precoces é que elas podem ter um impacto profundo sobre o potencial subsequente de cada pessoa. É no primeiro ano de vida que o panorama sonoro básico de nossa linguagem nativa é mapeada no sistema nervoso, fornecendo os elementos fonêmicos que evoluirão em linguagem. Outras linguagens podem ser adquiridas ao mesmo tempo com muito menos esforçco que em idades posteriores. Os pais geralmente exercem um papel dominante de educadores nestes primeiros anos, que estão sendo reconhecidos como sendo críticos para o desenvolvimento cognitivo e cerebral subseqüente.
Existem duas idéias novas que estão emergindo da pesquisa sobre cognição e desenvolvimento cerebral que podem dar novas direções para o planejamento e implementação educacional. Estas idéias, Sistemas Múltiplos de Memória, e Funções Executivas, serão descritas brevemente a seguir.
Sistemas Múltiplos de Memória
O cérebro humano tem uma notável plasticidade, a habilidade em ser modelado e modificado pelo crescimento de novas e mais complexas conexões entre células. Alguns neurônios desenvolvem até 50.000 conexões, um número espantoso quando consideramos que existe bilhões de neurônios no cérebro. A propriedade básica do córtex cerebral (as camadas externas nas convoluções cerebrais) é armazenar informação. Embora não entendemos exatamente como ocorre tal armazenamento, está claro que ele ocorre em múltiplas áreas corticais devotadas a diferentes tipos de memória. Algumas áreas se desenvolvem em sistemas de conhecimento que surgem das memórias lingüísticas, visuo-espaciais ou motoras. Outras regiões do cérebro armazenam informações a respeito de experiências emocionais, e, para unidades de memória maiores, tais como como completar um trabalho de casa, ou conseguir um emprego de professor. Portanto, aprendizado e memória não estão limitados a um único sistema neural ou processo. Existem múltiplos sistemas de memória, espalhados por diferentes áreas cerebraos, com conexões e vias que podem interconectá-las em distintos meios, variando até mesmo de individuo para individuo.
Como as habilidades de aprendizado e memória não estão geralmente desenvolvidas por completo em todas essas áreas, as abordagens educacionais que usam o conceito de sistemas de memória múltipla podem levar a um conhecimento mais profundo e com maior retenção. Por exemplo, materiais didáticos que usam analogias visuais e pessoais, esquemas visuais que mostram como conceitos verbais se relacionam espacialmente uns com os outros, e atividades que implementam passos de resolução de problemas, oferecem oportunidades para o envolvimento de sistemas múltiplos de memória. Estudantes que se demonstram fracos em um fluxo de processamento de memória, podem facilmente compensar isso quando outros modos de processamento estão disponíveis.
Função executiva é outro conceito neuropsicológico recentemente formulado. Um executor recebe responsabilidades, tais como levantar informações, impor organização, formular planos, fixar objetivos, manter controle sobre circunstâncias cambiantes, e até mesmo antecipar numerosas possibilidades e modificar objetivos e planos de acordo com as mesmas. Em estudos neuropsicológicos, as funções executivas têm sido demonstradas como sendo muito diferentes da inteligência geral e memória.
A criança pequena é um executor em floração de seu próprio conhecimento, emoções e comportamento. Aquelas áreas do cérebro que possibilitam funções executivas são as últimas a amadurecer, usualmente não antes da idade adulta jovem. Durante o desenvolvimento, as funções executivas tornam-se progressivamente mais conectadas aos domínios do conhecimento para fatos, números, palavras e imagens (os aspectos de "o que" e "onde" do conhecimento), para o propósito de como, porque e quando utilizar tal conhecimento em comportamentos dirigidos a metas. Por exemplo, como eu identifico e organizo os passos para completar um projeto independente? Como eu devo verificar meu progresso, de modo a avaliar o quanto falta para fazer? Estas são questões que os educadores podem ouvir de tempos em tempos, mas elas revelam quais podem ser os processos fundamentais para a adaptação e realizações humanas - nos gerenciando como aprendizes, desenvolvendo uma consciência quanto ao nosso conhecimento, tanto como à nossa falta de conhecimento, e sabendo como conseguir realizar vários objetivos usando habilidades executivas ou metacognitivas. Uma parte substancial das funções executivas consiste em desenvolver modelos mentais destes processos de "comos", "porques" e "quandos".
As funções executivas são modeladas por muitas influências educacionais e compreendem um conjuntos de habilidades e de conhecimento. As funções executivas podem ser ensinadas de alguma forma direta? A resposta é sim. Os elementos mais precoces das funções executivas começam com as interações pais-filhos, expandem-se muito nas brincadeiras, e florescem em atividades acadêmicas, sociais e recreativas mais complexas. Crianças se tornam mais efetivas como executores pessoais quando são desafiadas e treinadas para sê-lo. As habilidades de funções executivas foram incorporadas em cursos de redação, leitura e matemática, enfatizando estratégias específicas para aprendizagem, implementando passos de auto-instrução, e promovendo práticas colaborativas e independentes. Tais abordagens facilitam a aquisição de habilidades regulatórias ou auto-regulatórias que auxiliam uma criança a aprender, organizar e atingir metas, não apenas dentro da escola, mas por toda a vida.
Pais, educacores e neurocientistas podem iniciar um diálogo sobre como entender mais e utilizar mais os sistemas múltiplos de memória, e como introduzir cenários sonoros de linguagem mais cedo no desenvolvimento infantil, bem como promover o desenvolvimento de funções executivas elementares e avançadas em cada criança. Com tal colaboração, será possível atingir uma combinação de maior sucesso na aquisição e utilização do conhecimento. e uma gama mais ampla de habilidades para a adaptação e desempenho de cada criança ao longo de sua vida.
O Autor
O Dr. Paul Eslinger é especialista em Pediatria
do Desenvolvimento e Aprendizado, Penn State College of Medicine
Reprodução autorizada pelo autor. Tradução de Renato M.E. Sabbatini, PhD
Imagem: André Malavazzi, Copyright 2000 Universidade Estadual de Campinas, Brasil
Copyright 2003 Paul Eslinger
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Revista Cérebro
& Mente
Uma realização do Núcleo
de Informática Biomédica
Universidade Estadual de Campinas, Brasil
Publicado em 25.Mai.2003