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Você está ansioso. Uma angústia profunda o faz sentir-se como quem perdera um membro familiar. Tudo, menos feliz é o estado em que se encontra. É recomendado tomar um ansiolítico pelo seu médico e pronto: você, feito mágica, volta a sorrir, suas emoções se estabilizam e a vontade de viver se torna intensa. E o que ingeriu? Substâncias químicas!
Outro está deprimido. Pior: a tristeza, a autocomiseração, a incapacidade momentânea de não achar graça em nada, podem destruir essa pessoa. Sair, ver amigos, praticar esportes, não surtem efeitos. Nem vontade para essas coisas ela têm. É indicado adequadamente o uso de antidepressivos e em pouco tempo a vida dela muda radicalmente. Os sentimentos negativos cessam em intensidade e a estrutura emocional se restaura. O humor e a alegria de viver voltam a fazer parte de seu dia a dia. E o que ela ingeriu? Substâncias químicas!
Esses dois exemplos, em meio a tantos,
ilustram de maneira simplificada o poder curativo de certas substâncias.
Elas atuam em nível celular, nos neurônios, influindo no comportamento
visível demonstrado pelas pessoas através de seus sentimentos
e emoções.
Neurônio. (1). Os sinais gerados por um neurônio são enviados através do corpo celular (2), que contém o núcleo (2a), o "armazém" de informações genéticas. Axônios (3) são as principais unidades condutoras do neurônio. O cone axonal (2b) é a região na qual os sinais das células são iniciados. Células de Schwann (6), as quais não são partes da célula nervosa, mas um dos tipos das células gliais, exercem a importante função de isolar neurônios por envolver seus processos membranosos ao redor do axônio formando a bainha de mielina (7), uma substância gordurosa que ajuda os axônios a transmitirem mensagens mais rapidamente do que as não mielinizadas. A mielina é quebrada em vários pontos pelos nodos of Ranvier (4), de forma que em uma secção transversal o neurônio se parece como um cordão de salsichas. Ramos do axônio de um neurônio (o neurônio pré-sináptico) transmitem sinais a outro neurônio (o neurônio pós-sináptico) em um local chamado sinapse (5). |
Os
neurônios são células cerebrais constituintes do sistema
nervoso. Para um impulso nervoso se deslocar de um neurônio a outro
- a
sinapse - faz-se necessário a presença entre eles de
substâncias chamadas
neurotransmissoras. Nesse processo podem ocorrer reflexos para determinadas
regiões de nosso corpo, onde temos a sensação de que
o que sentimos é produzido no próprio local. Um aperto em
nosso peito devido a uma paixão levava os antigos a acharem que
a sede de nossos sentimentos amorosos era no coração...
A depressão caracteriza-se por uma baixa atividade neurônica devido à falta de substâncias desse tipo, como, por exemplo, a serotonina. O ansiolítico atua aumentando o efeito de neurotransmissores inibitórios da resposta nervosa, como o ácido gama-aminobutírico - GABA. A ansiedade, então, grosso modo, é um estado emocional no qual os neurônios têm suas atividades exageradas. Tudo isso é bem conhecido entre os médicos e pouco pelo público. Poucas são as reportagens, livros ou informações, relacionando toda essa química aos nossos sentimentos. Os cientistas, já há décadas, vêm descobrindo e utilizando para o nosso bem, na forma de medicamentos, as interligações entre neurotransmissores, condução nervosa, sentimentos e emoções. Estes dois últimos seriam produzidos no cérebro devido a estímulos internos ou externos, visando a perpetuação da espécie segundo a Teoria da Evolução de Darwin. Não formaríamos famílias, sociedades, etc., se não fosse a imensa variedade de sentimentos a que nos pertencem, formando poderosos vínculos entre nós e nossos semelhantes. Como apenas um exemplo, o amor e o afeto, e consequentemente a dedicação dos pais com os filhos, mostra de maneira clara esse elo de ligação entre eles. |
Nós nascemos completamente indefesos contra as adversidades do mundo exterior. Não só os humanos, mas os outros mamíferos e as aves são evoluídos suficientemente para cuidarem, por meses ou anos, de seus filhotes até atingirem a maturidade necessária para enfrentarem o mundo que os rodeia. A agressividade e até o medo, em forma de defesa, são importantes nessa luta pela sobrevivência e também fazem parte da rede intrincada de reações químicas no cérebro desses seres vivos que são os mais complexos do planeta.
Os peixes, os répteis, os anfíbios e os animais inferiores já nascem em condições favoráveis de luta para sobreviverem, não possuindo, ou pelo menos sendo pouco desenvolvida, uma região cerebral denominada sistema límbico. É esse sistema o principal responsável pelas nossas emoções e sentimentos.
Já se conseguiu, através de estimulação natural do sistema límbico, que pessoas chegassem a sentimentalismos exagerados, achando elas inexplicável esse tipo de comportamento. Em animais agressivos, a simples remoção de uma porção límbica chamada amígdala, fez com que eles se tornassem dóceis e calmos. Em situação oposta, a estimulação do funcionamento da amígdala levou um animal doméstico a estados de terror, agitação intensa e anormal, sem quaisquer motivos reais.
Os objetos de estudo das ciências são aqueles fenômenos percebidos pelos nossos sentidos, algumas vezes utilizando-se equipamentos específicos de laboratório, e que podemos depois entendê-los de maneira objetiva e racional. Fenômenos considerados como manifestações de nossa alma vem sendo sistematicamente estudados como poderosas interações químicas, capazes de levarem as pessoas desde a simples estados momentâneos de alegria ou tristeza, até a paixões avassaladoras e o amor.
Nosso cérebro é composto de um número de combinações sinápticas que ultrapassa o número de átomos do universo conhecido. O número de estados mentais, então, é muito grande, mas é evidente que não somos afetados por todos eles. Mesmo assim o restante é considerável a ponto do cérebro entrar em estados riquíssimos em complexidade e singularidade, tornando-o fonte daquelas situações ora negativas, ora positivas, às quais chamamos de emoções e sentimentos.
Para muitos isto soa como puro materialismo, entretanto, os filósofos cristãos e teólogos, entre outros, e em épocas nada adiantadas em Tecnologia, Medicina, Química, e ciências afins, atribuíram a causas sobrenaturais o que essas disciplinas estão descobrindo agora em termos de química cerebral. E os resultados dessas atribuições foram passadas de geração a geração até nós como fatos incontestáveis e intocáveis.
Se algumas substâncias químicas alteram profundamente os nossos sentimentos, então tudo aquilo que é sobrenatural, principalmente os nossos conceitos de alma e espírito, deverá sofrer com o tempo algumas modificações com respeito às suas influências sobre a nossa mente e nosso corpo. O futuro da Ciência será em descobrir até que ponto eles são afetados por tudo que não é sobrenatural. Se é que o sobrenatural existe...
Uma nova revolução filosófica-religiosa está prestes a acontecer. Não antes da Ciência ter certeza por onde começar, pois, lidar com conceitos tão arraigados em nossa civilização é tarefa, no mínimo, para ser realizada com muita responsabilidade.
O autor
Argos de Arruda Pinto Physicist - argos@linkway.com.br
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